segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

O 'meu' Calvinismo - revisto, acrescentado e atualizado, parte 1

Há algum tempo, eu publiquei um artigo intitulado, O ‘meu’ calvinismo. Longe de ser uma definição exaustiva e completa das minhas crenças, ali expus, quase como que um sumário, 8 parágrafos, sentenças simples, aforismos meus sobre alguns pontos da minha fé. O intento inicial era de expor a mim mesmo, de forma ordenada, as minhas convicções, acrescentando (ou contestando), corrigindo e explicando cada tese na medida que eu julgasse necessário. Em termo geral nele me declarei sendo um cristão calvinista, infralapariano, missiologico, contemporâneo, não-carismático, não-litúrgico, amilenista e criacionista.


Ocorre que lendo (e relendo), me veio a idéia de acrescentar ou, melhor explicar, algumas dessas definições. Assim, vem a primeira das (muitas) alterações (ou interações – risos) ao artigo, mas sinto muito – na verdade não! – desapontar alguns de meus amigos (principalmente no que tange o lapsarianismo) provavelmente, ao longo dessas interações, eu devo fortalecer algumas de minhas posições.

O primeiro ponto.

Uma das coisas que percebi no artigo, é que faltava a definição quanto à doutrina das escrituras. Em outros artigos eu expus o que creio ser a Palavra de Deus, mas para não fugir a ‘métrica’[1], deixo claro:

1- Somente a Bíblia, isso é, os 66 livros tradicionais são A Palavra de Deus, inerrante, infalível, divinamente inspirada, completa e plena, capaz e soberana, que não só nos revela quem é Deus – embora não seja o único lugar ou situação, ou ainda forma dessa revelação inteligível de Deus – como também revela a Sua vontade, para o Seu povo e Seu desígnio (parte conhecida) para o Cosmo. A Palavra de Deus é o pressuposto inegociável, autoritativo e primário. Por ela entende-se Revelação Divina, ou seja, Deus quis se revelar dessa forma, isso é, verbal e inteligivelmente apelando à razão do ser humano, e para o melhor aparelhamento do seu povo, Ele soberanamente estabeleceu e preservou tais escritos que podem (e devem), hoje (sec.xxi), ser encontrados (estudados, conhecidos e obedecidos) nos textos preservados da ação do tempo, da ação das heresias, da ação dos homens e da ação diabólica.

1A - Ainda sobre a doutrina das escrituras, é preciso afirmar que creio que o texto sagrado é possível de ser plenamente compreensível[2], e que esse texto revela exata e precisamente aquilo Deus desejou tornar conhecido tanto de si quanto de Sua santa vontade. Não sendo necessário nenhum acréscimo, geral ou especifico, nem contextualização[3], nem adoção de regras de interpretação extrínsecas à própria Bíblia, ou a submissão a alguém como se este detivesse o único direito de interpretá-la.

1B - Deus magistralmente inspirou, editou, preservou e preserva a Santa Bíblia. Para melhor entendimento das duas primeiras idéias é necessário a leitura do artigo Quae Scripturae? Divinitus ispirata est! e correlatos. Já na questão da preservação das palavras divinas, a afirmação é meio que óbvia. Deus preservará a sua Palavra (pelo tempo) para que sua pessoa e vontade sejam conhecidas por toda a Igreja de todas as eras, e assim possam encontrá-lo, conhecê-lo e obedecê-lo. 


Muitos objetam que a critica textual é uma ferramenta diabólica estruturada na falácia cientificista que desautoriza a Bíblia. Se, em algum momento da história da Ecdótica, o motivador foi direta ou indiretamente o Diabo, pouco importa! O fato é que tal disciplina, (bem como todas as outras – seja pela vontade ou a contragosto) tem se sujeitado e, por fim, reconhecido o poder e a soberania de Deus – por mais que seus proponentes eventualmente neguem. A existência de variantes textuais, demonstra, entre outras coisa, que o texto sagrado não é uma coleção de textos forjados, historicamente falsos, ou adulterado durantes os séculos (ideia que eu devo abordar em outro artigo). Nessas descobertas arqueológicas, analisadas a partir de métodos científicos, tem-se demonstrado a superioridade de tais escritos, no que tange a aceitabilidade à época; a divulgação no mundo antigo; e, a preservação física e a não corrupção (e deturpação) textual. 


Por exemplo, tratando-se do N.T., existem alguns manuscritos encontrados nas cavernas de Qumran que datam de 50 d.c. ou seja, bem poderia ser partes dos autógrafos, mas existem outros manuscritos, encontrado em diversas partes do globo terrestre, datados do primeiros séculos da era cristã em excelente estado de conservação e são provas incontestáveis da existência histórica do texto canônico como o conhecemos hoje. Em si tratando do V.T. as provas históricas são também inquestionáveis, tanto a tradição judaica como as enormes evidências arqueológicas colaboram com a confirmação da fé. Afinal, Deus é Senhor de tudo e controlando todos os detalhes históricos providenciou meios de preservar a Suas palavras para as gerações posteriores.

Assim antes de qualquer coisa poderia acrescentar ao ‘meu’ conceito de cristão calvinista (supra citado) a ideia de pressuposicionalista, ou seja, tudo começa e termina com a exposição da fé bíblica (o meu pressuposto inicial). Poderia me entitular “um homem de um livro só”. Todos os conceitos descritos ou abstraídos da Palavra de Deus, são artigos dogmáticos! Esses têm autoridade superior a qualquer outra classe de mandamentos, regras, conceitos ou formas. Como são orientações, conselhos, mandamentos e sacramentos divinos nada tem maior apelo que a evidência interna da própria Escritura Sagrada. Em toda a controvérsia, de qualquer tipo é a Bíblia a autoridade definitiva.

Mas visto que não ignoro – exatamente pelo crivo da autoridade incontestável da Bíblia – o uso da razão, do método, da especulação e da verificação empírica, para dar, também, a capacidade de conhecer, interpretar (leia-se, entender) e aceitar a V(v)erdade – que sempre será em algum nível revelação divina – não sei se serei considerado um pressuposicionalista pela maioria dos que assim se denominam, e mais, como sinceramente creio que afirmar a exclusividade autoritativa da Bíblia (Sola Scripturae) é condição básica para ser realmente um cristão autentico não vejo porque acrescentar a minha já extensa definição de fé, ideia de pressuposicionalista.
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[1] Me refiro a forma direta e sentencial de afirmar algumas doutrinas nesse artigo.
[2] Talvez aqui seja algo complexo de se avaliar, mas o texto em si pode ser conhecido pela razão, e é assim que ordinariamente a fé vem, ou seja, pelo convencimento da razão. Mas não quer dizer que um ímpio ou réprobo não sejam capazes de compreender o que o texto diz, na verdade eles são incapazes de crer, mesmo que entendam, visto que a fé é um dom de Deus – seja como fruto da obra redentora (Graça) seja como meio para se efetivar a salvação – tais homens desprovidos da dádiva divina nunca serão capazes de crer nas verdades da Bíblia (Jo 3;1 a 21).
[3] Contextualização no sentido de aproximar a verdade do texto à nossa cultura, isso é, mudar a essência bíblica para ser mais agradável aos ouvidos do séc.xxi; claro que a contextualização do cenário bíblico para a melhor assimilação das ordens divinas (princípios) é o âmago da pregação e deve ser buscada diligentemente, ou seja, usar de figuras, metáforas, expedientes técnicos e recursos atualmente disponíveis para clarificar as verdades bíblicas é não mais que procurar se apresentar a Deus aprovado como obreiro que maneja bem a Palavra da Verdade.

5 comentários:

  1. A Escritura, somente A Escritura!
    ótimo.
    Pastor Esli, é triste que mesmo na nossa igreja, já existe evidências que os que negam a inerrância estão, até mesmo em seminários...

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  2. Esli,

    muito bom texto. E necessário também num tempo em que, mesmo crentes, questionam a fidelidade e veracidade escriturística.

    Sabe de minha opinião sobre o texto crítico, que muitas vezes levam "estudiosos" a usá-lo como forma de desacreditar, se não o todo, alguma parte da Bíblia. E por, também, de alguma forma, se considerarem melhores leitores ou leitores mais qualificados por defenderem exclusões de trechos que fazem parte do Cânon, e assim permaneceram por séculos a fio, até pouco mais de cem anos atrás, quando manuscritos desprezados pela igreja ganharam status prioritário em relação à essa mesma tradição.

    Se atentarmos que Calvino, Lutero, Perkins e todos os puritanos e todas as Confissões de fé puritanas usavam o texto majoritário, não entendo o "endeusamento" de um texto recém validado exclusivamente pelo critério de antiguidade.

    Tenho algumas versões em casa que utilizo eventualmente para estudo, mas em minhas leituras e meditações não abro mão da ACF; a mesma que os reformados utilizaram para disseminar, semear, a palavra de Deus.

    Grande abraço!
    Cristo o abençoe!
    PS:1-Autoriza-me a republicá-lo?
    2- Com isso não estou a dizer que quem se utiliza do TC em suas leituras e estudos é herético.

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  3. Amigos (em especial o Luciano e o Jorge),

    De fato, é de suma importância defendermos a autoridade da Bíblia (ou será nos defendermos com ela?), principalmente nesses nossos dias de apatia espiritual, relativismo moral, e afrouxo eclesiástico. Ou somos o povo de Deus, escolhido para brilhar (e conservar) aqui, ou nada somos.

    Devemos levar a Palavra de Deus para todos como a única forma de salvação, sem exceções, sem barganha e sem medo.
    Entretanto isso não quer dizer que pela propagação do evangelho estejamos dispostos a matar – se bem que devemos estar dispostos a morrer – então devemos tentar ter paz como todos os homens, seja os da Ciência, seja os da Política, seja os do Comércio, isso é, devemos nos empenhar para ganharmos a simpatia de todos – a exemplo da igreja descrita em Atos 2. Vida cristã é sermos firmes e amorosos, inflexíveis e mansos, convictos e pacientes, dispostos e disponíveis, fervorosos e pacificadores, aguerridos e cautelosos, sagazes e prudentes, enfim, não é fácil, mas é possível.

    Sobre a questão especifica da Crítica Textual, vou apresentar mais argumentos em favor dela em breve. Entretanto acho que já deixei claro que o equilíbrio é a minha marca, então, uso o TC e acho ele melhor q o TM, até porque o TM é em si um TC antigo (explicarei melhor isso depois), mas concordo que usar de um expediente tão novo para desautorizar a Bíblia (ou parte dela) é um erro grande e perigosos de mais para eu enveredar. Na prática, utilizo-me de todos os tipos de texto disponível (meu E-sword, tem umas 25 versões em diversas línguas), ao invés de fechar com uma única versão, a ARA e NVI são as versões de cabeceira, e opto sempre pelo texto mais longo (em si tratando dos ‘originais’) crendo – no mínimo – que é melhor o excesso de explicações do que a falta de alguma parte inspirada.

    No mais, em Cristo a Palavra que não muda.
    Esli Soares

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  4. Querido irmão, as vezes vejo alguns falando sobre o assunto de TC e TM, mas bem poucos interagem com Wilbur Pickering. Sei que não será o seu caso, mas já leu a tese dele?

    http://www.luz.eti.br/resources/wilburnt.pdf

    abraços

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  5. Luciano,

    Li sim a tese do dr.Wilbur e mais alguns outros materiais. Não sou expert no assunto, mas vejo que uma posição mais tacanha é a que, em geral, dirige as posições nesse assunto.

    Quando enfim apresentar algo especificamente sobre a crítica textual eu devo sugerir a leitura dos artigo inclusive esse do dr.Wilbur.

    Cordialmente,
    Esli Soares

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